Flavio Cruz

A Maria se foi

 

A Maria foi embora, assim, sem mais nem menos. Falou qualquer coisa de vida monótona, tomar novo rumo, essas coisas. Claro, não acreditei, não podia ser, era só uma ameaça. E não é que, naquela maldita terça, eu chego em casa e ela tinha ido embora? Gavetas vazias, a casa limpinha e um bilhetinho curto. Escreveu até que era para meu próprio bem e que queria que eu fosse feliz. Pode? Ser feliz como? Nos primeiros dias achei que ia voltar, mas não... Era para valer..

Já faz algum tempo e estou tentando entrar na rotina. O diabo é que volta e meia me acho fazendo coisas estranhas. Quando chegava em  casa, à noitinha, batia na porta. Sabe, ao invés de abrir e ir entrando? Só para ver a carinha dela atendendo, dando um sorriso e mandando entrar:

- Vai entrando, estranho, que meu marido ainda não chegou.

E daí, nós dois ríamos, era uma gostosura. E não é que, às vezes, eu me esqueço e ainda bato antes de entrar? E, pior que isso, ainda fico um tempão, esperando, com aquela cara de tonto. Daí entristeço porque ela não aparece. E não é que outro dia, fiz comida para nós dois e, para completar, pus dois pratos na mesa, com talheres e tudo? Existem outras coisas que faço, que tenho vergonha de contar.  Contei essas coisas para meu amigo Juvenal. Ele falou que isso passa. É a força do hábito. Não sei, não. Meu amigo, não sei se isso passa, não...

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Published on e-Stories.org on 22.11.2017.

 
 

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